sábado, 13 de junho de 2009

A Velhice e a Sabedoria ou O Nosso Futuro

Velhos, idosos, 3ª idade, sinónimos numa nomenclatura que, na sociedade actual, parece cada vez mais, possuir uma conotação negativa. Somos uma espécie que adora rótulos, no entanto o significado não é suficiente sendo sempre dissecado em diferentes adjectivos. Vejamos, temos a 1ª Idade (infância/adolescência); 2ª Idade (adultos); 3ª Idade (idosos), dito de outra forma, totalmente aceitável nos tempos que correm: não produtivos; produtivos; improdutivos. A imagem social da velhice, que refuto e condeno, é a de um grande grupo de seres, homogéneo, não contributivos, sem legado e que para alem do mais sorve os recursos estatais, vulgo os nossos impostos. Numa sociedade que cultiva o físico e idolatra a juventude, é certo que esses seres velhos, feios de tanta ruga, e portadores de inúmeras formas de doença, não deveriam ser beneficiados por nada de útil produzirem para a sociedade. O próprio pseudo-reconhecimento do sector político-económico de que a forma produtiva se poderá manter até aos 65 anos, alargamento da idade da reforma, provoca comentários tipo: até os velhos são obrigados a trabalhar. Existe no entanto um paradigma à volta da velhice que parece ter o dom de a transformar numa dádiva dos deuses, é quando se torna necessário deixar à sua guarda os netos por uma imperativa saída nocturna ou um qualquer acontecimento social. Como dizia o meu avô “ não podemos matá-los, que podem vir a fazer falta” e acrescentando uma da minha autoria produzida aquando de uma formação de parentalidade para grávidas adolescentes em 2008, “ uma sociedade que vira as costas ao passado, não tem futuro, uma sociedade não acarinha os seus velhos, não tem presente”.

Se é verdade que ser velho não é, forçosamente, sinónimo de sabedoria, a verdade é que esta, como tantas coisas na vida, se constrói com o passar dos anos, com a experiência e com a vivência de cada um de nós, sendo assim potencialmente um velho, não só um acumulado de saberes mas fundamentalmente uma fonte de sabedoria. Segundo Pascual-Leone (1990) “ a sabedoria resulta da integração dialéctica do afecto, da cognição e das experiências de vida”. Num momento em que alguns de nós se questionam postulando a existência de uma 4ª Idade, até 5ª para os mais radicais, será o momento de definir de que forma integrar os mais velhos numa dinâmica de transmissão não só de saberes mas de saber viver. Uma dinâmica que parta da valorização do percurso existencial do ser, como refere Turkal, e que devolva a dignidade da existência aqueles que antes de nós ousaram crescer pessoal e socialmente criando assim as condições para a nossa própria evolução. Longe da caricaturização do velho como um ser em final de linha, equacioná-lo como alguém que vivenciou um complexo processo de aprendizagem, de interpretação e reinterpretação de respostas aos estímulos internos e externos, alguém que fruto das suas aprendizagens, mas também dos seus erros, construi-o um manancial de sabedoria que deveríamos canalizar a bem de todos. Tendemos a confundir a perda de capacidades, físicas ou mentais, próprias do envelhecimento, como perda de sabedoria. Também tendemos a considerar a dificuldade de verbalização como um sintoma do não saber. Só se pode concluir que tendemos muito e percebemos muito pouco, ou que é incómodo percebe-lo. Que dizer quando ao fim de décadas de oposição afirmamos que “o velho tinha razão”, será um retrocesso conceptual da nossa visão ou um sinal de sabedoria da idade? Considero que a manutenção de uma autonomia relativa é fundamental para o contínuo desenvolvimento da pessoa idosa, não sendo causa directa de inibição, a autonomia em conjunto com uma saúde física e mental preservada potencializa a consciência de uma necessária e permanente readaptação ao mundo que vivemos, não será fruto do acaso a crescente existência de universidades da terceira idade e o aumento da sua frequência. A sabedoria enquanto sistema complexo desenvolvido através da relação consigo, com os outros, com os saberes, e com os viveres é indissociável do ser idoso. Poderemos, em minha opinião, quantificar a sabedoria como idade x aprendizagens x relações, e compreenderíamos que a sabedoria se constrói na vida, com a vida e pela vida.

Um dia um velho sorridente dizia-me: “ Sabe porque estou aqui? quando percebi que tinha esquecido tudo foi uma alegria, podia aprender tudo outra vez. E para aprender as coisas novas tem de ser com vocês”. Velhice ou sabedoria?

Ser Adulto - eu e a aprendizagem

“Só aprendemos a ser sábios depois de aprendermos a ser simples.”
Agostinho da Silva

Olhando para trás, numa breve retrospectiva o meu percurso formativo sofreu das mesmas nuances que a maioria dos indivíduos. De um miúdo que desejava ser arquitecto, a um profissional da área social observa-se um percurso pontuado por constrangimentos, acasos, escolhas e balizado por fracassos e vitórias. Segundo Bandura (1977), uma das formas de promover a aprendizagem, é facultar ao sujeito um contexto de grupo que permita a observação e modelação de comportamentos mediante um processo reflexivo sobre atitudes e argumentos gerados em contexto grupal, daqui se infere a importância do outro na nosso percurso individual. Assim da professora “sensível” que provocou o desgosto pela matemática ao professor “anarca” que incentivava à participação comunitária activa, se desenrolou grande parte da compreensão da dinâmica do mundo. Mais que a educação formal, foi sem dúvida o desporto, de equipa (voleibol), que contribuiu para uma concepção organizativa e de dependência, de todos entre todos, em prol de objectivos concretos e comuns. Da caça submarina retirei a capacidade de compreender que tudo tem um tempo, embora também tudo se possa desenrolar num segundo. Na minha vida adulta muita da minha aprendizagem social deve-se a actividade desenvolvida com grupos carenciados sejam eles crianças e jovens ou mesmo adultos. Considerando os últimos 20 anos, tenho 43, fisiologicamente posso considerar que ainda não denotei as perdas que a literatura descreve, seja pelo facto de continuar a ter desempenhos idênticos, seja pelo facto de não desenvolver outro tipo de actividades onde essas perdas pudessem ser mais evidentes. Fui pai aos 35 e considero a hipótese de voltar a ser. Relacionalmente entendi os primeiros anos da fase adulta como um estágio educativo preparatório de uma relação, findo o devaneio, prepara-se o futuro. A nível profissional estabilizei na profissão nunca abdicando de experienciar novas abordagens, este facto tem permitido evoluir e diversificar de forma a evitar a cristalização. Se actualmente o tempo de ponderação para tomada de decisão teve tendência a aumentar, fruto das variáveis família, economia, nem por isso descarto o risco, embora controlado, nas decisões, principalmente nas profissionais. Mentiria se dissesse que o facto de a minha esposa ter a mesma profissão é isento nestas tomadas de decisão. Uma maior maturidade não me isentou de cometer erros, no entanto, permitiu-me antecipar constrangimentos e integrar as consequências de uma forma mais pedagógica. Se tal como afirmam alguns autores, possuir sabedoria é ter consciência de que não se sabe tudo e ter definidos os nossos limites, então posso assegurar, com alguma relativa certeza, que me tornei um sábio. Menos no que concerne à intervenção pois que ai considero que a vontade move montanhas. A minha formação profissional teve o condão de me despertar para a finitude das abordagens e para a não existência de fronteiras nas especialidades. Cedo defini uma linha de auto-formação que me tem permitido ir para além do óbvio da profissão e ao mesmo tempo manter uma atitude open mind que se tem traduzido numa multiplicidade de colaborações em equipas multi e pluri disciplinares, em Portugal e no estrangeiro, o que tem um benefício não mensurável na minha capacidade de me entender enquanto pessoa e enquanto indivíduo microbiano da sociedade.